Quando falamos de desenvolvimento cognitivo na infância, geralmente, pensamos em linguagem, memória, aprendizagem e atenção. Entretanto, existe um grupo de crianças cujo desenvolvimento não apenas acompanha o esperado, ele ultrapassa significativamente os marcos típicos. São as crianças com altas habilidades/superdotação (AH/SD), cujo potencial cognitivo pode se destacar em áreas como lógica, criatividade, linguagem, matemática, liderança ou artes.
Nesse sentido, embora muitos imaginem que essas crianças “não dão trabalho”, a realidade é bem mais complexa. Afinal, junto com o alto desempenho, podem surgir desafios emocionais, sociais e escolares que exigem compreensão, acolhimento e acompanhamento profissional.
O que é altas habilidades/superdotação?
Em primeiro lugar, de acordo com as diretrizes brasileiras e internacionais, considera-se que uma criança apresenta altas habilidades quando demonstra desempenho excepcional em uma ou mais áreas, com habilidades cognitivas muito acima da média para a idade.
Isso não se limita não apenas ao QI elevado, mas também a características como, por exemplo:
- pensamento mais rápido;
- curiosidade intensa;
- memória avançada;
- criatividade acima do esperado;
- hiperfoco em interesses específicos;
- autonomia precoce para resolver problemas complexos.
Por sua vez, no Brasil, o termo “superdotação” é frequentemente usado para crianças com altas habilidades gerais ou específicas, reconhecido pela política de educação especial e programas de enriquecimento escolar.

Nem sempre é fácil identificar os tipos de desenvolvimento cognitivo na infância
Muitas dessas crianças passam despercebidas porque não apresentam o “estereótipo do aluno perfeito”. Embora, em alguns casos, o desempenho não apareça na escola, seja por desmotivação, ansiedade, falta de estímulo adequado ou até mesmo por dificuldades emocionais. Por isso, a avaliação neuropsicológica é fundamental para entender o perfil da criança, seus pontos fortes, vulnerabilidades e necessidades educacionais.
Por que altas habilidades não significam apenas vantagens?
Ter alto potencial cognitivo não garante saúde emocional. Pelo contrário: crianças superdotadas apresentam uma série de vulnerabilidades socioemocionais que muitas vezes são negligenciadas. Entre as mais comuns estão, por exemplo:
1. Sensibilidade emocional aumentada
Elas costumam perceber nuances e injustiças com muito mais intensidade. Isso pode gerar sofrimento precoce, preocupação excessiva, medo de errar ou dificuldade em lidar com frustrações.
2. Desafios nas relações sociais
O pensamento acelerado, o vocabulário avançado ou os interesses muito específicos podem afastá-las de crianças da mesma idade. Muitas relatam sensação de não pertencimento, isolamento ou dificuldade em estabelecer amizades.
3. Perfeccionismo e autocobrança
A capacidade alta muitas vezes gera expectativas internas e externas de desempenho impecável. Isso pode levar a ansiedade, bloqueios, procrastinação e medo de falhar.
4. Descompasso entre áreas do desenvolvimento
É comum que a criança apresente habilidades intelectuais muito avançadas, mas maturidade emocional condizente com a idade ou até abaixo dela. Essa “assincronia do desenvolvimento” é uma das maiores causas de sofrimento.

E quando há desafios associados ao desenvolvimento cognitivo de altas habilidades?
Sem dúvidas, muitas crianças com altas habilidades também apresentam dificuldades específicas como, por exemplo, transtornos de aprendizagem, TDAH ou questões emocionais.
Dessa maneira, esse quadro é chamado de dupla excepcionalidade e exige olhar cuidadoso. Crianças com AH/SD e TDAH, por exemplo, podem ter raciocínio brilhante, mas dificuldades reais para organizar tarefas e manter foco. Nesse sentido, quando não compreendidas, são rotuladas como “desatentas”, “preguiçosas” ou “desinteressadas”.
Da mesma forma, crianças superdotadas com ansiedade podem evitar novos desafios, mesmo tendo alto potencial, o que gera sofrimento escolar e familiar.
O papel da família e da escola
Acima de tudo, para que a criança com altas habilidades se desenvolva de forma saudável, o apoio do ambiente é essencial. Famílias e escolas desempenham papéis complementares:
- estimular sem pressionar: oferecer oportunidades é importante, mas sem sobrecarregar.
- valorizar o esforço, não apenas o resultado: isso previne o perfeccionismo.
- promover habilidades socioemocionais: como empatia, comunicação, tolerância à frustração e cooperação.
- garantir adaptações escolares adequadas: enriquecimento curricular, desafios compatíveis com o nível de habilidade e acompanhamento especializado.
Quando buscar ajuda profissional?
A intervenção psicológica para o desenvolvimento cognitivo de altas habilidades pode ser fundamental quando a criança apresenta:
- sofrimento emocional persistente;
- dificuldade de socialização;
- ansiedade ou medo de errar;
- comportamentos de oposição ou desmotivação escolar;
- frustrações intensas diante de desafios simples.
Por fim, a avaliação neuropsicológica, aliada à psicoterapia ou ao acompanhamento psicopedagógico, ajuda a construir um plano de desenvolvimento saudável, respeitando a singularidade da criança.

A importância de reconhecer e acolher
Em suma, altas habilidades não são apenas um talento, são também uma forma diferente de perceber, sentir e se relacionar com o mundo. Dessa maneira, quando essa criança encontra ambientes que respeitam seu ritmo, sua sensibilidade e seus interesses, ela floresce.
Contudo, quando não encontra, pode enfrentar sofrimento real e silencioso.
Por isso, entender o desenvolvimento cognitivo na infância significa olhar para além do desempenho: é reconhecer a criança em sua totalidade, com suas forças, vulnerabilidades e necessidades emocionais. E esse é justamente o caminho para que ela cresça de forma saudável, equilibrada e feliz.
Conte com a BurnUp
Com a BurnUp, você não está sozinho! Estamos ao seu lado para encontrar o bem-estar que vem de dentro pra fora. Conte conosco no dia a dia e, se precisar, busque ajuda!
Canais disponíveis pelo Ministério da Saúde ou Governo Federal:
- Centro de Valorização da Vida (CVV) – 188 (ligação gratuita) ou acesse o chat no cvv.org.br.
- CAPS e Unidades Básicas de Saúde mais perto da sua casa (Saúde da Família, Postos e Centros de Saúde);
- Se sentir que é urgente, procure a UPA 24H mais perto da sua casa ou chame o SAMU ligando 192 (ligação gratuita).
Referências
- Sternberg, R. J. (2024). Reframing social and emotional development of the gifted. Behaviors, 14(9), 752. https://doi.org/10.3390/behaviors14090752
- Carmona-Santiago, J., & García-Perales, R. (2024). Differences in socio-emotional competencies between high-ability students and typically developing students. Frontiers in Education, 9, 1450982. https://doi.org/10.3389/feduc.2024.1450982
- Abeysekera, L., & Dawson, P. (2024). Unpacking the underachievement of gifted students: A systematic review of internal and external factors. Heliyon, 10(12), e29398. https://doi.org/10.1016/j.heliyon.2024.e29398
- Pérez, S. G. (2025). Características socioemocionais de crianças com altas habilidades/superdotação: um estudo exploratório. Revista de Educação Especial, 38(1), 1–15.
- Silva, A. M., & Virgolim, A. M. R. (2024). Altas habilidades e superdotação: inclusão educacional e formação docente. Educar Mais, 8, 4045. https://doi.org/10.15536/revistaeducarmais.8.2024.4045



